Por Mariana Baia
Campos do Jordão, SP – A decisão do Governo do Estado de São Paulo de retirar o Comitê de Bacias Hidrográficas da Serra da Mantiqueira (CBH-SM) da cidade de Campos do Jordão sem consulta pública tem gerado forte reação da sociedade civil, ambientalistas e lideranças locais. A medida, que partiu da diretora da Regional de Taubaté, Márcia Eliza da Silva, foi tomada sem aviso prévio à população, levantando preocupações sobre os impactos ambientais e a falta de transparência na gestão hídrica da região.
Criado em 2001, o CBH-SM é responsável pelo planejamento e gestão dos recursos hídricos das cidades de Campos do Jordão, Santo Antônio do Pinhal e São Bento do Sapucaí. O comitê desempenha um papel essencial na preservação dos mananciais da Serra da Mantiqueira e na administração da cobrança pelo uso da água na região. Ao longo de sua existência, o CBH-SM investiu mais de R$ 40 milhões em projetos voltados à proteção de nascentes e ao saneamento básico local.
Campos do Jordão: Relevância Mundial e Política
Campos do Jordão é um dos destinos turísticos mais importantes do Brasil, reconhecida internacionalmente como a “Suíça Brasileira” devido ao seu clima frio, sua arquitetura europeia e sua posição privilegiada na Serra da Mantiqueira. A cidade atrai milhares de visitantes anualmente, sendo palco de eventos culturais de grande porte, como o Festival Internacional de Inverno, que reúne músicos e artistas de todo o mundo.
Além de seu papel turístico e ambiental, Campos do Jordão também possui uma relevância política significativa. A cidade abriga o Palácio Boa Vista, residência oficial de inverno do governador do Estado de São Paulo. O palácio não apenas serve como local de descanso para os governadores, mas também recebe reuniões políticas e eventos de grande importância para o estado. A presença dessa estrutura reforça a influência política da cidade e sua posição estratégica dentro da administração estadual.
A Serra da Mantiqueira e a Importância nos Estudos sobre Mudanças Climáticas
A Serra da Mantiqueira tem papel crucial na regulação climática e hídrica do Sudeste brasileiro. A região abriga um dos maiores fragmentos de Mata Atlântica do país, funcionando como um verdadeiro “corredor ecológico” para a biodiversidade.
Devido a sua altitude e características geográficas, a Serra da Mantiqueira tem sido alvo de importantes estudos científicos sobre mudanças climáticas, incluindo pesquisas que serão debatidas na COP 30, conferência mundial do clima que será sediada pelo Brasil em 2025. A região é considerada um indicador sensível dos impactos do aquecimento global, pois sofre diretamente com alterações na temperatura e no regime de chuvas, que afetam sua vegetação, nascentes e biodiversidade.
Pesquisadores alertam que a remoção do CBH-SM pode comprometer a continuidade desses estudos, prejudicando o monitoramento das mudanças ambientais e a implementação de estratégias para mitigação dos efeitos do clima na região.
As Nascentes Mais Altas do Rio da Prata
As nascentes mais altas do Rio da Prata estão localizadas no Bairro Umuarama, em Campos do Jordão, São Paulo, a mais de 1.750 metros de altitude. Essas nascentes formam o Rio Sapucaí, que segue rumo ao território mineiro, integrando um importante sistema hídrico da região.
Para registrar historicamente essas nascentes, foi lançado o Monumento das 4 Nações em 29 de abril de 1959. O monumento, projetado pelo engenheiro Acácio Vilalba, simboliza a importância dessas águas para os países que compõem a Bacia do Rio da Prata.
Essas águas alimentam o Rio Capivari, que percorre diversas vilas jordanenses antes de seguir em direção a Minas Gerais. O Capivari, ao se juntar ao Ribeirão das Perdizes, dá origem ao Sapucaí-Guaçu, um importante rio que integra a Bacia do Paraná e, posteriormente, o Rio da Prata.
Um Rio de Importância Internacional
O Rio da Prata é um dos mais importantes cursos d’água da América do Sul e tem alcance internacional. Ele abrange cinco países: Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai, formando uma bacia hidrográfica que cobre aproximadamente 4 milhões de km². Suas águas percorrem territórios brasileiros e seguem até sua foz no Oceano Atlântico, marcando a divisa entre Argentina e Uruguai. Além de sua relevância ambiental, o Rio da Prata tem grande importância econômica e social, servindo como fonte de água, transporte e energia para milhões de pessoas.
Repercussão e Impactos Ambientais
A saída do CBH-SM de Campos do Jordão levanta preocupações sobre o futuro da gestão hídrica da região. Ambientalistas alertam para o risco de descontinuidade de projetos fundamentais para a conservação das águas da Serra da Mantiqueira. Além disso, a decisão sem consulta popular gera questionamentos sobre a transparência e a participação social na administração dos recursos naturais.
Os Comitês de Bacias Hidrográficas são instâncias colegiadas do Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos, funcionando como fóruns de deliberação com a participação de representantes do governo, sociedade civil e setor produtivo. A ausência de diálogo na retirada do CBH-SM contraria o princípio da gestão participativa, essencial para garantir a preservação e o uso sustentável das águas.
Diante desse cenário, a sociedade civil não descarta acionar o Ministério Público para investigar o desmonte do governo do estado na questão ambiental e seus prejuízos para a Serra da Mantiqueira. Organizações ambientais e representantes locais argumentam que a retirada do comitê pode comprometer a proteção dos recursos hídricos e resultar em danos irreversíveis ao ecossistema da região.
Até o momento, o Governo do Estado de São Paulo não se pronunciou oficialmente sobre os motivos da mudança e os impactos esperados. Para a população local e especialistas em meio ambiente, a decisão representa um retrocesso na política de proteção hídrica da região, que abriga importantes nascentes e rios fundamentais para o abastecimento de diversos municípios.
A sociedade civil agora pressiona por esclarecimentos e busca reverter a decisão, reivindicando maior transparência e participação na gestão dos recursos naturais da Serra da Mantiqueira, especialmente em um momento de atenção global às questões climáticas, com o Brasil se preparando para sediar a COP 30.