Eu & a Educação – continuidade para o verdadeiro progresso

Gestores públicos devem aprimorar e ampliar o alcance de medidas já em curso em vez de criar programas do zero, escreve Andrea Pinheiro

abismo que existe entre o ensino das escolas privadas de ponta e o da média das escolas públicas brasileiras, certamente é um dos fatores que contribuem para termos uma divisão de “castas” no país. A educação de baixa qualidade condena parte significativa da população ao subemprego e à uma renda precarizada, nutrindo o círculo vicioso da pobreza.

Essa condição tão cruel só será debelada quando crianças e jovens virem seu direito a uma educação de qualidade cumprido e respeitado.

Seria ótimo se os governos pudessem prover com excelência tudo o que uma sociedade precisa, mas essa está longe de ser a realidade. Portanto, fica impossível olhar o desafio da desigualdade social de braços cruzados.

Qualquer pessoa que ocupe um lugar minimamente privilegiado no contexto da sociedade que vivemos acaba trazendo para si a responsabilidade de complementar a ação do Estado, ajudando tantos setores quanto conseguir. As iniciativas do 3º setor se tornam imprescindíveis para viabilizar essa tarefa.

Isso ficou muito claro para mim desde bem cedo.  Em minha família sempre doamos recursos para vários projetos, mas tive uma carreira no setor financeiro que, por muitos anos, impediu meu envolvimento direto com aquilo que eu apoiava. Hoje, com mais flexibilidade, consigo me dedicar mais.  Escolhemos a educação como principal setor para apoiar, pois, de todas as frentes, talvez seja essa a única que possa realmente produzir mudanças estruturais de médio e longo prazo para resolver a raiz da injustiça social no país.

Desde 2017, iniciamos uma colaboração com a Parceiros da Educação, que implementa parcerias de médio e longo prazo entre sociedade civil, escolas e redes municipais com o objetivo de melhorar a aprendizagem dos alunos. O que nos atraiu logo de cara foi a possibilidade de apoiar um programa já aprimorado, fruto de quase 15 anos de experiência que a instituição tinha à época. Esse amadurecimento fez com que mudassem o foco inicial dos investimentos em infraestrutura para mirar, mais acertadamente, na formação de professores, coordenadores e diretores.

Construir ou reformar prédios é importante, mas àquela altura estava claro para todos que priorizar os profissionais da educação dava mais resultados sobre a qualidade do ensino e impactava mais a aprendizagem dos estudantes do que só ter paredes bem pintadas. Foi uma grande sintonia de objetivos.

Nossa 1ª parceria foi com a Escola Estadual Professora Marisa de Mello em São Paulo, e foi incrível. A diretora, bastante empenhada e apaixonada, liderou a equipe de professores, que abraçou o programa com muita dedicação e os bons números, claro, não demoraram a aparecer. A nota da escola no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), que mede a qualidade do ensino de cada escola, subiu bastante.

Vale destacar que essa era uma escola de período integral, o que faz toda a diferença no desenvolvimento dos alunos. Com esse sistema, eles melhoram o vínculo com os professores, aumentam o tempo de estudo, ganham mais oportunidades de expandir suas habilidades com esportes, artes e atividades lúdicas e, muitas vezes, ainda se alimentam mais e melhor do que na própria casa.

Me envolvi bastante com a equipe. Conhecia muitos pelo nome e pudemos sentir de perto outras demandas, como a da sala de computadores, que tinha menos máquinas do que o necessário e muitas delas, quebradas. Depois de algumas melhorias e do aumento da quantidade de tablets, ouvimos dos professores de matemática que o uso da tecnologia foi um divisor de águas nas aulas sobre frações, por exemplo.  A 2ª escola que financiamos nos trouxe uma realidade bem pior e mais triste, pois começamos o trabalho durante a pandemia.

Alunos mais velhos, de uma região mais vulnerável e um acesso muito restrito dos estudantes às aulas on-line fez o desafio se multiplicar.  Se para jovens privilegiados a dificuldade foi grande, imaginem para os de pior condição socioeconômica, que tinham de dividir o único celular da casa e, às vezes, nem de internet dispunham. As dificuldades dessa fase podem trazer consequências enormes para o futuro desses meninos e meninas.

É fato que a educação é a base de tudo. Essa certeza vem do fato de ser cearense e ter acompanhado de perto o que o investimento em educação produziu no meu Estado, que deu um grande salto de crescimento depois que o acesso à boa educação melhorou. Foi um processo lento, de passos miúdos, mas que contou com a continuidade ao longo de muitos governos, e isso foi fundamental para o êxito do modelo.

Deve-se ressaltar que nenhuma política chega a bons resultados se cada governante que chega ao poder decide reinventar a roda, mudando tudo de bom que o anterior fez. Essa mentalidade só atrapalha. E quem paga por essa briga de egos é a população que mais precisa.

Sob esse prisma, fico bastante esperançosa por ver meus conterrâneos Camilo Santana e Izolda Cela à frente do Ministério da Educação, já que fizeram um trabalho fantástico no Ceará e souberam dar continuidade, aprimorando e aumentando o alcance, a uma política educacional que já estava dando certo.  A perspectiva é boa, acho que o Brasil todo hoje olha para a educação com mais carinho. Muitos Estados têm priorizado essa área e reproduzido essa coerência. Dessa maneira, caminham para melhorar o desempenho de seus alunos e, assim, darmos o passo largo de que o Brasil tanto precisa.

Fonte: Poder360