Super Filme RIPHAGEN produção sobre abusos dos Nazistas contra Judeus na Holanda

As produções que se debruçam sobre a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) tornaram-se tão usuais que se configuram um gênero à parte em meio aos filmes de guerra. Nessas histórias, plenas de movimento, às vezes quase a ponto de cansar o espectador, situações impensáveis em tempos de normalidade política e personagens ricos, complexos, plurais, para o bem e para o mal, vão saindo das brumas do tempo para se apresentar sob uma forma um pouco menos abstrata, adquirem contornos humanos, com suas dores e suas glórias, conquistam graças à  intrepidez de suas ações ou escandalizam e provocam o asco devido à covardia, à  indiferença para com os demais, ao ódio indisfarçado e orgulhoso quanto a seu comportamento bárbaro. Cada vez mais, temas espinhosos — e batidos —, como, claro, a hegemonia de Adolf Hitler (1889-1945) na Alemanha dos anos 1930 e 1940, ganham pontos de vista novos e excepcionais, o que leva à conclusão imediata de que o assunto, definitivamente, não está superado e de que é sempre necessário se falar sobre suas questões mais nebulosas.

“Riphagen” (2016) começa esboçando o perfil de seu protagonista. O diretor, Pieter Kuijpers, fornece ao público indícios de quem vem a ser Bernardus Andries Riphagen, um ex-marinheiro holandês lotado no Sicherheitsdienst, o SD, a unidade mais básica na hierarquia da polícia política nazista. Ao longo da Segunda Guerra, o SD aumenta sua influência junto à Geheime Staatspolizei, a Polícia Secreta do Estado alemão de Hitler, que estendeu seus tentáculos sobre toda a Europa. A Gestapo foi de suma importância quanto a garantir ao ditador sucesso em seu projeto de poder, cuja plataforma de maior destaque era o genocídio do povo judeu, além de comunistas, deficientes físicos, ciganos, homossexuais e qualquer outro indivíduo que ameaçasse a instituição e a liderança dos arianos, a dita raça pura apregoada por Hitler, para quem não deveria haver lugar para a degeneração, personificada por essas figuras. Hoje, transcorridos quase 77 anos do fim da guerra, em 2 de setembro de 1945, é absurdo pensar que a tacanhice intelectual de Hitler fosse tão longe; decerto ainda hoje se pode aplicar, a título de justificativa exageradamente sintética para o vasto alcance do nazismo, a frase lapidar de Martin Luther King Jr. (1929-1968), sobre ser mais preocupante o silêncio dos bons que o grito dos maus. Perfeito.

À diferença dos demais, os judeus tinham posses. Como o lobo encarniçado na perseguição às ovelhas, o personagem-título sabe onde encontrar suas vítimas. Riphagen, bom trabalho de Jeroen van Koningsbrugge, ascende rápido na hierarquia do sistema de inteligência, que lhe permite saber onde os judeus se escondem, e com eles seus bens valiosos.  Kuijpers é hábil em fazer o público vislumbrar logo a natureza oportunista do burocrata, menos afeto à ideologia do nazismo que as vantagens que sua posição poderia lhe assegurar. Assumindo conscientemente o status de agente duplo da Alemanha de Hitler, o personagem de Van Koningsbrugge se apropria desses objetos — antiguidades, relógios, baixelas de prata —, prometendo devolvê-los quando do encerramento dos confrontos. Como se sabe, muitas daquelas pessoas foram despachadas para campos de trabalhos forçados na Alemanha, os chamados campos de concentração, e morreram, de fome, de tifo, de exaustão, ou envenenadas nas câmaras de gás, uma invenção genuinamente nazista, enquanto Riphagen se tornava um homem extraordinariamente rico, apto a desposar Gretjee, a namorada vivida por Lisa Zweerman. Seu intento de deixar a Holanda e partir para um idílico degredo com Gretjee são frustrados por Jan, de Kay Greidanus, membro da Resistência, grupo que reúne os poucos sobreviventes da invasão nazista à Holanda. Judeu, Jan passa a perseguir o algoz de sua gente, mas ele escapa. Dries Riphagen envelhece no exílio em Montreux, na Suíça, e morre de câncer em 1973, aos 65 anos, sem nunca ter pagado por seus crimes.

Fonte Revista Bula